Brasília – O II Seminário de Linhas de Transmissão de Energia Elétrica (SELTE) terminou com uma mensagem clara: o futuro da transmissão no Brasil passa pela integração entre inovação tecnológica e excelência operacional. Durante dois dias, especialistas, pesquisadores, gestores públicos e representantes das principais empresas do setor debateram soluções para os desafios atuais e futuros da infraestrutura elétrica.
No discurso de encerramento, o presidente da ABRATE, Mário Miranda, destacou o papel de liderança do Brasil no cenário internacional: “O sistema de transmissão no Brasil é uma referência no mundo e segue em constante evolução, incorporando a inteligência artificial como aliada estratégica para garantir confiabilidade e sustentabilidade ao sistema”.
Em seu balanço final sobre o II Seminário de Linhas de Transmissão de Energia Elétrica (SELTE), Josias Araújo, CEO da Eng Smart Lead, destacou o sucesso da edição e o papel do seminário na consolidação de um espaço qualificado de debates técnicos para o setor. “Conseguimos avançar em discussões estratégicas, trazendo soluções práticas e compartilhando experiências que fortalecem o setor”, afirmou. Josias ressaltou ainda que o evento se diferencia pela qualidade técnica das apresentações e pela relevância dos painéis, que mostram a importância de integrar inovação tecnológica, segurança e sustentabilidade ao dia a dia da operação.
A segunda edição do SELTE consolidou-se como um espaço de troca qualificada de conhecimento, reunindo debates sobre inteligência artificial, adaptação às mudanças climáticas, recapacitação de linhas, gestão da qualidade, O&M e segurança operativa. Os painéis mostraram que a combinação de tecnologia digital, inovação em materiais, regulação eficiente e gestão de processos é fundamental para fortalecer a resiliência do setor.
Com o sucesso da edição de 2025, o SELTE reafirma seu papel como fórum estratégico do setor elétrico, apontando caminhos para que a transmissão continue sendo o alicerce da transição energética brasileira.
Gestão da qualidade em linhas de transmissão exige integração entre fiscalização, comissionamento e manutenção
O quarto painel do II SELTE destacou como a gestão da qualidade na implantação, fiscalização e comissionamento de linhas é decisiva para garantir a confiabilidade e a longevidade do sistema elétrico. Especialistas apresentaram experiências e lições aprendidas em obras e operações, mostrando que a qualidade não depende apenas da tecnologia, mas da integração entre processos, equipes e monitoramento contínuo.
Abrindo o painel, André Luís Padovan (Eletrobras) trouxe uma reflexão sobre a relação entre fiscalização e comissionamento, tradicionalmente vistas como funções separadas. Em sua fala, destacou que ambas são complementares: enquanto a fiscalização garante conformidade de prazos, custos e normas durante a obra, o comissionamento assegura a qualidade e o funcionamento dos sistemas no longo prazo. Ele apresentou casos reais de falhas decorrentes de problemas nessas etapas e defendeu a criação de comissões de testes integradas, com representantes de todas as equipes, rastreabilidade dos protocolos de obra e análise prévia de documentação pela engenharia de manutenção. “Organização, conhecimento e equipes qualificadas são os pilares para transformar fiscalização e comissionamento em aliados, e não em pontos de conflito”, afirmou.
Na sequência, Carla Damasceno Peixoto abordou os avanços e desafios das linhas de cabos isolados de alta tensão, cada vez mais utilizadas em áreas urbanas densas e travessias críticas. Apesar do custo inicial até dez vezes maior que o de linhas aéreas, ela apontou que os ganhos em segurança, confiabilidade e impacto visual justificam a adoção em contextos específicos. Entre os principais desafios, citou a dissipação térmica, a complexidade da infraestrutura civil e a dificuldade de reparos em caso de falha. Como boas práticas, destacou a importância de equipes certificadas, monitoramento em tempo real e planos de contingência, além do uso de técnicas não destrutivas, como perfuração horizontal direcional, para reduzir impactos em áreas urbanas.
Encerrando o painel, Adriana de Castro Passos Martins ressaltou a importância da gestão do ciclo de vida dos isoladores, componentes que representam apenas entre 5% e 8% do custo de uma linha, mas estão associados a mais de 70% das saídas de serviço e até 50% dos custos de manutenção. Ela apresentou os diferentes tipos de isoladores (vidro, porcelana e poliméricos), seus modos de falha e os fatores ambientais que aceleram a degradação, como poluição, descargas atmosféricas e queimadas. Adriana também destacou a necessidade de inspeções regulares, uso de tecnologias como termografia, ultravioleta e drones, além de revestimentos hidrofóbicos para aumentar a confiabilidade. “Um isolador bem especificado, monitorado e mantido pode evitar falhas sistêmicas e reduzir significativamente custos de operação”, afirmou.
O&M de linhas de transmissão ganha novas ferramentas de eficiência, segurança e inovação
O quinto painel do II SELTE foi dedicado a discutir os aspectos de desempenho de processos na Operação e Manutenção (O&M), reunindo especialistas que apresentaram soluções voltadas à eficiência operacional, à redução de custos, à segurança dos eletricistas e ao uso de tecnologias digitais de monitoramento.
Luis Felipe Semensato e Renato Aguiar (Taesa), apresentaram um novo método de acesso ao potencial para execução de linha viva em torres do tipo Cross-Rope. Desenvolvido a partir de simulações e aplicado em condições reais, o procedimento permite trabalhos na fase central das torres garantindo segurança ergonômica e distâncias mínimas de abordagem conforme as normas internacionais. Entre os ganhos, estão a redução do tempo de execução e a padronização de práticas em situações de alta complexidade. “A participação das equipes no processo de desenvolvimento e treinamento foi fundamental para validar a solução”, destacaram.
Na sequência, Augustinho Simões apresentou o uso de drones asa-fixa eVTOL em operações BVLOS (Beyond Visual Line of Sight) para inspeções de linhas de transmissão. Com sensores LiDAR e câmeras de alta resolução, os equipamentos atingem produtividade acima de 300 km/dia, sem emissão de poluentes e sem risco a tripulantes. As aplicações incluem identificação de ocupações irregulares em faixas de servidão, detecção de erosões, medição de catenárias e criação de gêmeos digitais. O especialista destacou ainda a integração dos drones com equipes locais de manutenção, possibilitando inspeções contínuas e rápidas respostas a eventos críticos.
O painel também contou com a apresentação de Túlio Marcus Machado Alves (CIER), que compartilhou os resultados de um estudo de benchmarking sobre indicadores de custos de O&M em empresas transmissoras da América Latina. O levantamento, que envolveu 16 empresas de oito países, apontou práticas que diferenciam as companhias mais eficientes, como padronização da cadeia de valor, uso de dashboards dinâmicos em PowerBI e metodologias DEA e SFA para estimar custos eficientes. “O benchmarking permite identificar sobrecustos e estruturar planos de melhoria, reforçando a competitividade das transmissoras da região”, afirmou.
Carlos do Nascimento, da Cemig GT, apresentou experiências com capacidade dinâmica de linhas aéreas (DLR), que incorpora variáveis meteorológicas em tempo real para determinar a ampacidade das linhas. Ele destacou projetos que utilizam gêmeos digitais e o sistema VibraTorre, baseado em sensores vibracionais para monitorar a saúde estrutural de torres. Os testes em Minas Gerais mostraram que o DLR pode antecipar cenários críticos, aumentar a utilização segura da rede e reduzir falhas estruturais, consolidando-se como ferramenta de P&D aplicada ao setor.
Segurança e inovação moldam o futuro da operação da transmissão
No sexto painel, o debate pautou a necessidade de equilibrar segurança operativa e inovação tecnológica para garantir a confiabilidade do Sistema Interligado Nacional (SIN). Representantes do ONS, de empresas de transmissão e do setor privado destacaram soluções para enfrentar desafios como o crescimento das fontes renováveis, os riscos de congestionamento e a corrosividade em ativos.
Abrindo o painel, Sumara Duarte Ticom, do ONS, destacou que a expansão das fontes renováveis e a descentralização do sistema exigem mais flexibilidade e controlabilidade da transmissão. Ela apresentou indicadores de robustez da rede e alertou para o aumento das restrições de escoamento de energia. Entre as soluções em andamento, citou leilões de reserva de capacidade, resposta da demanda, uso de baterias e compensadores síncronos. “A transmissão é o elo forte do sistema elétrico: conecta regiões, viabiliza o uso da energia mais barata e sustenta a confiabilidade do SIN”, ressaltou.
Na sequência, Fernando Almeida Diniz (Argo Energia) compartilhou os resultados de estudos sobre corrosão em estruturas e acessórios de linhas de transmissão, especialmente em regiões litorâneas do Nordeste. Foram apresentados casos de falhas em cabos para-raios, fundações e acessórios metálicos, que comprometem a durabilidade e a segurança dos ativos. Como resposta, a empresa desenvolve um projeto de P&D com uso de redes neurais artificiais para mapear e prever a taxa de corrosão, aliado a inspeções com drones e gêmeos digitais. “Nosso objetivo é transformar dados em inteligência preditiva para reduzir custos de manutenção e evitar falhas sistêmicas”, destacou.
Encerrando o painel, Renato Guimarães Ribeiro (ISA Energia Brasil) apresentou a tecnologia SSSC (Static Synchronous Series Compensator) como alternativa para otimizar a utilização das linhas existentes e reduzir congestionamentos. A solução permite redirecionar fluxos de energia sem necessidade imediata de construção de novas linhas, trazendo benefícios como menor prazo de implantação, custo competitivo e baixo impacto ambiental. O projeto-piloto em Ribeirão Preto (SP), com investimento de aproximadamente R$ 94 milhões, é o primeiro do gênero no Brasil. “Trata-se de uma tecnologia modular e versátil, capaz de aumentar a controlabilidade da rede e postergar investimentos em novas infraestruturas”, explicou.
Agência Escola da Energia